Café Paulista, um cantinho do passado Texto publicado em 14 de Novembro de 2006 - |
por Laire José Giraud * |
Santos já não tem os excelentes serviços dos bondes do início do século passado nem a Rua do Comércio abriga a centena de escritórios de corretagem de café. Mas um outro café, até os dias de hoje, continua resistindo aos efeitos do tempo. É o Café Paulista, o mais antigo estabelecimento da cidade, que completou no último dia 25 de março, 95 anos de vida. Cartão comercial do Café Paulista do início da década de 1950. (Acervo: Laire José Giraud) Vale lembrar que para os aficionados dos bondes voltou a circular já há alguns anos o bonde turístico que faz o passeio pelo Centro Histórico da Cidade. No momento, o percurso está sendo ampliado. O espanhol Manoel Rodrigues Gil, o conhecido Manolo, divide com o irmão, José Antonio, a propriedade do restaurante. “Comecei a trabalhar aqui, em 1950, na copa do café. Nunca mais saí”, conta Manolo. Como lembrança daquela época, ele guarda o tempo em que as mesas eram de mármore e quando os operadores do comércio de café eram maioria na clientela. Interior do Café Paulista, na época da sua fundação em 1911, vendo-se seus frequentadores, com vestimentas e hábitos da época. Imagem presenteada por Jaime Caldas. Os clientes, rigorosamente vestidos de terno e chapéu, experimentavam algumas modalidades de café. A média comum era cuidadosamente preparada em partes iguais de café e leite. A moda francesa era apenas um pingo de café, e à moda inglesa, com um pingo de leite. Na bandeja dos garçons iam três leiteiras, uma para água quente, outra para café e a última para leite. O Café Paulista tem clientes antigos e fiéis. O historiador Jaime Caldas conta que freqüenta o café desde os anos 40. Na época não tinha esse negócio de tomar café no balcão. Os garçons serviam nas mesas, com muita cortesia, acompanhado de bolo de fubá. Habituado a receber em suas mesas políticos da cidade e do Estado, o Café Paulista guarda até hoje o apelido de Senadinho. Dos mais antigos, como o governador Adhemar de Barros, Jânio Quadros e Laudo Natel, Mário Covas, aos contemporâneos como Orestes Quércia, Paulo Maluf e o presidente reeleito Luiz Inácio Lula da Silva. Políticos de Santos como os antigos prefeitos, Antonio Feliciano, Silvio Fernandes Lopes, Beto Mansur, todos já passaram pelo café, palco de negociações políticas. A Praça Rui Barbosa, na entrada da Rua do Comércio, vendo-se à esquerda o local onde funciona a atual loja Ao Camiseiro. O Café Paulista na imagem fica no prédio próximo ao veículo que se aproxima da famosa praça. – 1934. Acervo: Laire José Giraud O Café Paulista foi um dos sobreviventes de uma época em que o Centro da cidade era o coração dos negócios, da boemia e do lazer. Dos grandes cafés e restaurantes do início do século, como o Espéria, o Marreiro e o Boêmia, o Paulista venceu o tempo. E prova que ainda hoje, com uma das melhores cozinhas da cidade, que tem muito fôlego e charme para oferecer. Como disse em artigo recente, durante alguns anos da Década de 90, costumava, no final da tarde, dirigir-me para o conhecido Café Paulista, que fica no início da Rua do Comércio, no Centro Histórico de Santos. Nesse famoso local da Cidade, costumava sentar-me na companhia de pessoas que apreciavam as coisas de Santos, como o poeta Narciso de Andrade, Waldemar Capella, Jaime Caldas, Dario Gonçalves e Waldir dos Santos (falecido), entre muitos que apareciam esporadicamente, mas que apreciavam as coisas santistas. A Bolsa Oficial do Café, hoje Museu do Café, com executivos da época, após um dos famosos pregões exis- tentes na década de 1920. Cartão- postal, acervo: Laire José Giraud As conversas variavam muito, pois os assuntos - com um pouco de exagero - pendiam para o infinito. Assim conversávamos até onde a nossa memória alcançasse sobre assuntos como cinemas do passado, bares e restaurantes, cinemas, lojas, clubes, firmas exportadoras de café que não mais existiam, colégios, antigas namoradas, entre outros. Veja mais imagens: Cartão-postal mostrando a Rua do Comércio, esquina com XV de No- vembro, ao fundo a Bolsa Oficial do Café, além de vários corretores e comissários do café. – 1930. Acervo: Laire José Giraud A imagem mostra dois classificadores de café, das inúmeras exportadoras de café do passado, como: American Coffee, Hard & Hand, Theodore Wille, Anderson Clayton. Os classifica- dores gozaram de grande prestígio e eram disputados pelos grandes exportadores. Muitos freqüentavam o Café Paulista. Acervo: Laire José Giraud. Trabalhadores do porto, carregando sacas do Ouro Verde para embar- que dos navios com destino ao comércio exterior. O prédio que aparece no cartão-postal é a antiga Alfândega do Porto de Santos, situada no mesmo local da atual. – 1910. Acervo: Laire José Giraud. Trabalhadores do porto já no momento do embarque de sacas de café para o interior dos cargueiros da época. Década de 1920. Acervo: Laire José Giraud. O Café Paulista foi contemporâneo dos anos dourados dos navios de passageiros, ou seja, da época em que o Porto de Santos fazia o papel dos aeroportos dos dias de hoje e por onde passavam os viajantes. Atracados, os navios Alcântara e Serpa Pinto. Ao fundo, o Monte Serrat. – 1952. Acervo: Rubens Santo Marini (foto utilizada no livro: Photografias & Fotografias do Porto de Santos). Os bondes hoje não são a base do transporte como era em décadas passadas. Na imagem, o famoso bonde Y e o prédio de Santos mais famoso de todos os tempos - o Parque Balneário Hotel, que ficava na esquina mais famosa de Santos: Ana Costa com a Av. Vicente de Car- valho – 1938. Acervo: Laire José Giraud |
* Laire José Giraud é despachante aduaneiro, colecionador de cartões-postais da Cidade e de transatlânticos antigos. Colaborador da Revista de Marinha de Portugal. Publicou cinco livros, como autor e co-autor, sobre temas da Santos antiga. |
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
Café Paulista: uma história de quase 100 anos em Santos
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